Neste momento de retomada pós pandemia e no futuro próximo, a bicicleta cada vez mais terá papel de destaque no mundo e na economia. Para o turismo, em particular de vários países europeus, a bicicleta será o veículo para reviver o setor, só na Itália o cicloturismo pode injetar mais de 4,7 bilhões de euros na economia. Um exemplo de turismo sustentável que também pode ser adaptado para muitas localidades brasileiras
A bicicleta mais uma vez acende uma chama da esperança. Se ela é um meio de transporte que vem se mostrando essencial na retomada das atividades em várias cidades da Comunidade Europeia após a pandemia, para a uma boa parte da rede hoteleira italiana poderá ser uma salvação.
Com o início da alta temporada do verão europeu, alguns hotéis que reabriram nesse primeiro período de retomada de atividades estão encontrando algumas dificuldades para conseguir atrair turistas, principalmente aqueles localizados no litoral , porém há vários hotéis, principalmente os bike friendly que estão indo contra essa tendência de esvaziamento e até podem ter incrementos de visitantes quando se compara a movimentação de anos anteriores.
O turismo voltado para a bicicleta – ou o cicloturismo vem apresentando crescimento rápido e constante nos últimos anos em todo o mundo. Essa forma de turismo combina desenvolvimento econômico, qualidade do meio ambiente e vida saudável, de acordo com uma abordagem sustentável e que segue os princípios da Agenda 2030 da ONU na promoção da prosperidade, bem estar, proteção do meio ambiente e combate às alterações climáticas.
Os hotéis, pousadas e hospedarias voltadas ao agroturismo ou turismo rural que hospedam ciclistas já vinham sinalizando um forte crescimento antes da pandemia da Covid-19, agora são estes estabelecimentos que graças ao cicloturismo estão despontando e parecem ser a nova tendência do turismo europeu; além da mudança comportamental dos viajantes que começam a valorizar um meio capaz de garantir, de maneira natural, o distanciamento social necessário, somado a isso também podem ser destacadas algumas iniciativas vindas de órgãos oficiais de incentivo a esse tipo de turismo, principalmente no norte da Itália.
Segundo dados divulgados pela associação ambientalista Legambiente e pelo Instituto Italiano de Desenvolvimento Turístico – Isnart em seu segundo relatório sobre o turismo em bicicleta, a estimativa é de que só de turistas italianos até o final de 2020 sejam mais de 3 milhões e as pernoites aumentarão cerca de 26% , atingindo a marca de 25,9 milhões.
Em 2019, segundo esse mesmo estudo, o cicloturismo gerou quase 55 milhões de pernoites, aí incluídos também os turistas estrangeiros; em seu próprio país os italianos representam um pouco menos da metade do mercado.
A importância do cicloturismo se destaca pelo fato de que os pernoites representam 6,1% do total e as despesas gerais são de 4,7 bilhões euros, ou 5,6% do total, dos quais 3 bilhões de euros são gerados por turistas estrangeiros. O gasto médio diário per capita do cicloturista é de aproximadamente 75 euros.
A região que mais tem atraído pessoas para o turismo em bicicleta e com uma estrutura de destaque é a do Trentino-Alto Adige, ao norte, transformando-se na mais ‘turística em bicicleta’ da Itália, com 16 milhões de pernoites, o que representa 15 % do total de turistas com despesas da ordem de 1,1 bilhão de euros.
Ainda no norte outras regiões de grande relevância são a da Emilia-Romagna e Lombardia que somadas ao Trentino, a participação no cicloturismo sobe para além do 70% do total.
No resto da Itália há sinais claros de um crescimento das atividades em regiões mais ao sul estão se preparando para este crescimento como vem acontecendo na Puglia, Calabria, Sicília e Sardenha. Localidades à beira-mar, as mais atingidas pela crise, cada vez mais focam na criação de novas ciclovias, muitas delas estão se aproveitando de um financiamento do governo italiano, alocado para o período dos próximos dois anos, para ser utilizado na mobilidade urbana.
O conceito de hotéis ‘bike frindly’ (amigo da bicicleta) com oficinas mecânica, espaço para limpeza da bicicleta, assistência médica e fisioterapia, pontos para recargas de baterias para e-bikes ou mesmo aluguel de bicicletas para o turista ganham cada vez mais espaço.
“O uso da bicicleta, que economiza 1,5 milhão de toneladas de CO2 por ano, representa uma resposta ideal à necessidade de regeneração após um período desconfortável” – destaca a Legambiente em seu trabalho – “A bicicleta também garante um distanciamento natural físico e adaptabilidade e versatilidade em contextos de qualquer tipo e é particularmente adequada para o turismo de proximidade”, uma nova tendência conhecida como staycation – ou turismo perto de casa com atividades de lazer a uma curta distância e muitas vezes sem requer acomodação noturna.
Uma pesquisa da FIAB – Federação Italiana de Meio Ambiente e Bicicleta – revela dados importantes, por lá as experiências de turismo em bicicleta são feitas geralmente por casais (28%) ou em grupos de amigos (23%); 70% dos trajetos diários tem entre 50 e 70 km e a duração média das férias em duas rodas é de 5 noites, sendo um que 50% dos viajantes em bicicleta faz mais de 6 pernoites geralmente dentro da Itália, dando preferência por acomodações em pousadas (48%) que oferecem um bom café da manhã. A mesma pesquisa em sua conclusão, aponta que quem já fez suas férias em bicicleta, declara-se propenso a repeti-la envolvendo também amigos.
Um exemplo que por aqui no Brasil pode ganhar força e serviria para movimentar uma rede de pequenos e médios empresários. Há vários projetos de ciclorutrismo espalhados pelo país – com maior destaque para os estados do Sul, mas não temos uma política nacional de incentivo para fomentar essa modalidade de turismo.
O Paraná vem se destacando com a criação de Leis que implantaram os Circuitos do Alto Iguaçu, do Sudoeste, do Litoral e ainda com processos em andamento para a criação dos Campos Gerais ou do Pé Vermelho. Em Santa Catrina destaca-se o circuito do Vale Europeu e ainda o Vale dos Vinhedos no Rio /grande do Sul.
Fomentar o cicloturismo exige muita ação coletiva e algum esforço do Estado em todas suas esferas com o controle mais rigoroso do trafego de veículos a motor nas estradas compartilhadas com ciclistas , sinalização adequada ao longo de todos os itinerários e muita informação sobre as ciclovias e os serviços disponíveis ao longo dos trajetos são fundamentais para o desenvolvimento dessa nova maneira de viajar, não esquecendo que a segurança e o cuidado das rotas, a facilidade de acesso às instalações do hotel para ciclistas e a disponibilidade de serviços de prevenção de roubos, como estacionamento vigiado podem fazer a diferença para escolher ou definir uma viagem em bicicleta.