O ciclista espanhol Fran Ventoso publicou uma carta aberta aonde expôs seus momentos de sofrimento durante o corte provocado por um disco de freio na última Paris>Roubaix. O acidente, que não foi o único no dia, serviu para que o sindicato dos ciclistas profissionais, de forma tardia pedisse a suspensão dos testes, pelo menos da forma em que esse equipamento se apresenta hoje. A indústria que esperava já na próxima temporada alimentar, com o uso dos freios a disco no pelotão, seus lucros terá que se mexer e apresentar um novo produto mais seguro…
Muito pouco se repercutiu sobre o acidente do ciclista da Movistar, Fran Ventoso, na última Paris-Roubaix, nada se falou de que houve mais uma vítima, o belga Nikolas Maes da Etixx-Quick Step. Houve até quem se atrevesse a questionar se o acidente do espanhol tinha mesmo sido provocado por um disco, como fez o gerente da Lampre-Merida, Brent Copeland, que mesmo após ter visto no hospital o corte na perna do ciclista ainda tinha dúvidas se aquela lesão poderia ter sido provocada por um disco.
Para a aprovação dos testes a pressão dos fabricantes e montadoras sobre a UCI foi grande, excetuando-se uma marca tradicional, que após dar-se conta que seria dobrada no mercado, apresentou seus protótipos em teste para sinalizar às equipes que ficassem tranquilas, se o desejo é por freios a disco atendemos o seu pedido.
A revolução que a utilização dos freios a disco provocará no mundo da bicicleta é grande, afinal não há melhor argumento que o “testimonial” de um profissional para induzir o grande público a trocar suas bicicletas, se um profissional não usa, para que o amador ou o domingueiro se voltaria à novidade? É disso que também se trata o jogo, não apenas da melhoria da qualidade da frenagem, mas de uma substancial renovação de frota, novos padrões de quadros, novas rodas e alguns milhões girando num mercado que precisava de um chacoalhão.
Os defensores das lâminas cortantes nunca se preocuparam com certos argumentos como os problemas nas trocas de rodas e muito menos com a segurança do ciclista, tratavam quem os questionasse com desdém, claro que muitos motivados por interesses comerciais escondiam-se atrás do argumento da melhor frenagem. Ninguém se atreveu a pensar nos mecânicos que durante uma corrida teriam que redobrar a atenção e até cogitar a utilização de luvas para não queimar com um disco aquecido (sim nas descidas esquentam muito, e queimam a pele também). Agora que apareceu uma vítima, por parte dos defensores se fez um silêncio profundo.
Foi preciso que “a bola cantada” por muitos acontecesse e uma carta aberta de Fran Ventoso, publicada no site da Movistar e reverberada em todos os meios que seguem o ciclismo no mundo e nas redes sociais para que a CPA – Associação dos Ciclistas Profissionais e a Comissão de Equipamentos da UCI pedissem a suspensão dos testes.
A CPA alega que comunicou os vários organizadores de provas e a UCI para que não se fizessem os testes pois a entidade conhecia a posição contraria de muitos ciclistas e dos riscos que o uso deste tipo de freio poderia trazer ao pelotão. A CPA pode até ter feito esse movimento, mas o esforço foi tímido e sem uma provocação mais enérgica, e agora como sabemos, foram necessárias duas vítimas para uma posição mais convincente e uma discussão para pedir junto a Comissão de Equipamentos da UCI a suspensão dos testes, ao menos da forma como os discos se apresentem hoje. “Nós não queremos parar o progresso dos freios a disco, mas não queremos arriscar a segurança dos ciclistas”.
Carta aberta: Fran Ventoso
“Tenho treze anos no ciclismo profissional e outros tantos nas categorias de base. Sim, vinte e seis anos de bicicleta, cada dia treinando e aproveitando do que mais gosto, da minha paixão. Desde os seis anos competindo, e continuo fazendo isso e desfrutando muito. Contente em ter feito da minha vocação minha profissão.
Como qualquer esporte, o ciclismo foi evoluindo em muitos aspectos técnicos…. e em outros nem tanto.
Em todos estes anos vi melhorias no material: primeiro no aço; depois no alumínio; e mais tarde no carbono. Este último chegou para ficar, graças às suas características técnicas, rigidez e leveza. Também vi como passamos dos firma-pés para os pedais de encaixe, muito mais confortáveis, eficazes e seguros. Dos capacetes com tiras de couro passamos aos capacetes cada vez mais leves com desenhos espetaculares e, ainda com todas as garantias de segurança.
Também vi uma evolução muito importante nas transmissões. Minha primeira bicicleta tinha uma coroa e três pinhões; agora já rodamos com dos, inclusive três e onze pinhões (ndt.: cassete)… e certo que não acaba nisso. Tudo isso com um sistema de testes e erros nada fácil. Lembro-me das primeiras quebras de corrente quando passamos para as dez velocidades: algo assim como elos que se abriam por materiais que não eram totalmente confiáveis (ainda acontece). Podemos falar também da revolução que nos trouxe o câmbio eletrônico. No começo nos surpreendeu e o julgávamos (não é necessário, pode falhar, as baterias, minha bicicleta conectada na rede…). Agora não nos imaginamos na bicicleta sem ele.
Faz um par de anos começaram a aparecer as primeiras bicicletas com freios a disco no ciclo-cross e havia rumores de que existia a possibilidade de que começassem a testá-los em competições de ciclismo de estrada.
Antes de mais nada quero dizer que sou o primeiro a recomendar os freios a disco, seja para o ciclo-cross ou para um ciclo-amador que sai com seus amigos para desfrutar do nosso esporte.
Mas em uma competição profissional…. Será que alguém realmente pensou que não iria acontecer? É verdade que ninguém pensou que são perigosos? Que cortam, que são autênticos facões gigantes?
Na última Paris-Roubaix só duas equipes usaram. Duas equipes com oito ciclistas cada uma. No total, dezesseis ciclistas que transportavam trinta e dois discos no pelotão. Pois bem: em um trecho de pavê, no km 130 concretamente, se forma um pacote e consequentemente uma freada que me faz chocar na traseira do ciclista que está à minha frente que tentava se livrar da queda. Não chego a cair – apenas minha perna toca na parte traseira da bicicleta – e continuo.
Pouco depois de retomar a marcha, olho para a perna: não dói , não tem muito sangue, mas vejo que parte do periósteo está aparente (ndt.: uma membrana de tecido conjuntivo denso, vascularizada, fibrosa e resistente que envolve por completo os ossos). Vejo o tecido que cobre a tíbia. Vou para a direita me jogo na grama, coloco as mãos no rosto, e começo a sentir tonturas… aguardo pelo carro da equipe e a ambulância, enquanto passam muitas coisas pela cabeça.
Azar? Justo comigo? Não acredito: a poucos quilômetros se confirmam os pensamentos.
Quinze quilômetros adiante entra na ambulância Nikolas Maes, da equipe Etixx-Quick Step. Tem um corte profundo em um de seus joelhos produzido por um disco, um desses trinta e dois. A pergunta é imediata: O que acontecerá quanto tivermos 396 discos em uma corrida aonde os 198 ciclistas lutamos por uma posição e as quedas são inevitáveis?
Os discos NUNCA deveriam ter chegado ao pelotão profissional, ao menos como são conhecidos neste momento. Ao menos até que contem com sistemas de proteção e segurança que não os transformem em verdadeiras facas instaladas nas bicicletas. Eu não conheço um ciclista que ficou sem poder de frenagem com os freios tradicionais. Eu não conheci alguém que não tivesse as rodas derrapando quando você freia com toda a força, não importando se são freios tradicionais ou a disco. Então: por que usá-los?
Porém, há problemas para trocar as rodas depois de um furo; problemas para os carros neutros no caso de que seja o momento em que o carro da tua equipe não pode te dar assistência…. e o mais importante: são facas que a certa velocidade se convertem em autênticos facões. Há corridas em que alcançamos velocidades máximas de 80, 90 e 100 quilômetros por hora.
Eu tive sorte: foi só a perna, somente o músculo e a pele. Você consegue imaginar um disco em uma jugular, em uma femoral ? Não: melhor não imaginar.
E tudo isso acontece porque a Associação dos Ciclistas Profissionais (CPA), associações nacionais de ciclistas, federações nacionais e internacionais, equipes e , especialmente, NÓS, OS CICLISTAS PROFISSIONAIS, não fizemos nada. Mas agora é preciso agir e colocar senso comum à aquilo que é uma evidência. Sempre pensamos que enquanto não acontecer comigo não é um problema. Esperamos que aconteçam os outros para tomar medidas. Antes ou depois pode acontecer com qualquer um: são as probabilidades, todos temos as mesmas. Os profissionais devemos olhar além do nosso próprio umbigo, e utilizo esta expressão para que fique claro. Outros nos dizem o que temos que fazer, mas não podemos esquecer que NÓS DEVEMOS TER A DECISÃO DA ESCOLHA.
Os discos cortam. Foi a minha vez, mas pode ser a de qualquer um”
Fran Ventoso
Penso que freio em bicicleta é simplesmente para diminuir velocidade. Parar um bike numa situação eminente de choque é muito complicado, pois a roda, seja o freio tradicional ou a disco, vai travar e jogar o ciclista ao chão. A não ser talvez, que criem um freio ABS, daqueles que não travam.
Digo e repito: pra que ter um puta freio, se os pneus da Speed não agarram no asfalto? Pra mim, freio a disco nas speeds, é besteira! É querer matar um mosquito com uma bazuca.