Nem Tóquio e muito menos Nova York! O Giro 2018 deverá ter sua Grande Partenza do outro lado do Mediterrâneo, em Israel, na cidade sagrada de Jerusalém. Porém há quem questione, os motivos são vários e passam pela logística das equipes e a segurança para a realização da volta
Por enquanto não há nada definido, mas os comentários e notas que vinham tomando conta da imprensa especializada a alguns meses ficam cada vez mais consistentes. O comunicado oficial só deve sair na segunda-feira 18 de setembro e virá direto da Terra Santa: o GIRO 2018 parte de Israel. Mais precisamente de Jerusalém, a cidade sagrada das três maiores religiões monoteístas
A abertura do Giro 2018 – a Grande Partenza – deverá ser realizada na Cidade Antiga – o lado histórico de Jerusalém – com uma crono (não está definido se individual ou por equipes). Ao todo seriam disputadas três etapas, sendo que além da crono, uma percorreria o deserto de Negev e a terceria levaria à Tel Aviv centro financeiro e tecnológico de Israel, ao final da jornada a caravana cruzaria o Mediterrâneo em direção à Sicília.
Ainda sem a divulgação de todo o roteiro a ser percorrido pela caravana, uma outra hipótese levantada é a de que o Giro teria sua última etapa disputada em Roma e quiçá com uma chegada ao Vaticano. Duas cidades sagradas unidas pelo esporte e ainda com um grande apelo de levar ao mundo uma mensagem de paz e um forte sinal político, afinal em 2018 comemora-se o 70º aniversário da fundação do Estado de Israel.
O apelo midiático está garantido, os argumentos parecem fortes e a RCS Sport tem do outro lado do Mediterrâneo a parceria com o Israel Cycling Academy, a equipe Pro Continetal administrada por Ran Margaliot que teve uma breve passagem como profissional na SaxoBank de 2012. A ICA já estaria costurando essa ação praticamente desde que foi criada no final de 2014 com o apoio de Peter Sagan; de um rockstar israelense; de Ran Margaliot, um ex-ciclista profissional nascido e criado em Israel; de Ron Baron, um investidor entusiasta de bicicleta e do bilionário Sylvan Adams que já colocou um bom dinheiro na equipe.
O acordo para largada em Jerusalém deixa claro que um convite vai para as mãos da Israel Cycling Academy, o que já limitaria a apenas 3 wild card’s a serem distribuídos às equipes mais importantes no cenário internacional ou de acordo aos interesses da RCS. Vale destacar que o acordo vinha sendo costurado a tempos, não é em vão que a Israel Cycling Academy, neste ano, tem como um dos principais patrocinadores o Ministério do Turismo de Israel que viu no ciclismo uma ótima ferramenta para promover o país.
A ICA sinalizou, mesmo que discretamente com um possíveis contratações para 2018, mais um sinal de que o acordo entre a RCS e os organizadores locais estaria praticamente selado. Como reforço um dos prováveis contratados poderia ser o belga, de 31 anos, Ben Hermans que se recupera de fraturas de uma queda sofrida no Tour da Polônia. Mas ainda é pouco para uma equipe que, segundo o seu fundador Ron Baron, aspira já em 2019 fazer sua estreia no Tour de France.
Seguindo o roteiro de uma largada em território italiano e outra no exterior, a Grande Partenza do Giro de 2018 acenava com outras possibilidades, a largada em Praga, na república Checa, ou em Varsóvia, na Polônia, dois países com muito mais afinidade com o esporte; que já tem em seu território eventos que conseguem atrair um bom público e que em termos de logística seria o mais razoável . Partindo desses preceitos, gente do meio e sem receio de mostrar sua opinião está questionando essa nova aventura.
Até o momento foram poucos os que se posicionaram contra a possível largada do outro lado do Mediterrâneo, na Terra Santa. E por mais surpreendente que possa parecer um dos que adotou uma postura radicalmente contrária foi Angelo Zomegnan, o jornalista e ex-diretor do Giro e da RCS Sport, da AIOCC – Associação Internacional dos Organizadores de Corridas Ciclísticas, trabalhou também no lançamento da equipe Lampre-Merida, enfim uma pessoa com muito conhecimento da modalidade e com experiência de sobra. No pelotão, o primeiro a se manifestar contrário foi o belga Jan Bakelans
Zomegnan, em um texto publicado em seu site pessoal, deixa claro que a motivação econômica conduziu a escolha, porém suas duras críticas se endereçam à segurança na região e ilustra a matéria com um video de um ataque terrorista contra civis em jerusalém. Trata a Grande Partenza como a Largada do Medo e aponta para os conflitos diários na região, da radicalização da violência no Oriente Médio com “uma nova Intifada virando a esquina” adicionando o componente religioso para uma área devastada por um conflito atávico.
No pelotão a primeira voz a se levantar, foi a do belga da AG2R , Jan Bakelants, apesar de não ser um dos grandes nomes ou um líder no grupo, mostrou sua posição em declaração ao jornal esportivo Sporza: “Me incomoda que nunca se preocupam em pedir a opinião dos ciclistas. São eles que garantem o espetáculo. No passado havia rumores de uma provável largada de New York ou do Japão e estou surpreso que desta vez isso acontecerá de verdade. As equipes não poderão levar suas próprias viaturas e a organização deverá colocar a disposição um monte de equipamentos. Fará muito calor, assim vamos consumir muitas caramanholas, precisaremos de geladeiras, sorvetes e outras coisas. Em última analise este é um problema para a organização, mas uma equipe se preocupa com este tipo de situações. Você não tem o seu material e não é possível aplicar o modus operandi da equipe”. E para completar, apesar de mostrar interesse em disputar mais um Giro, Bakelants foi taxativo: “Eu estava muito disposto a disputar mais um Giro, mas se ele começar em Israel, acho que não é para mim. Pode ser um belo país, mas eu acho que é um país que não tem um envolvimento com a bicicleta. Então, eu digo não”.
Embora Israel, e a cidade de Jerusalém nos remetam a momentos de tensão e conflitos é importante destacar que já é local de eventos e destino de esportistas; um bom exemplo é a Maratona internacional realizada na cidade no mês de março. Jerusalém já faz alguns quantos anos, também já recebe jogos da Euroliga de Basquete e o ciclismo começou a tomar algum destaque com a realização de algumas da Gran Fondo Giro de Italia que homenagearam Gino Bartali ou como a do Mar Morto com ativa participação da ICA ou a GFNY Jerusalém que está programada para abril do próximo ano. A preocupação com segurança existe, o ciclismo é um espetáculo aberto o que torna tudo mais complicado, sabe-se que para um evento como este a cidade de Jerusalém tem um efetivo de mais de 3 mil soldados. Porém é mais importante pensar que equipes como o Team Emirates ou Bahrain-Merida até agora não se manifestaram contrárias, o que pode ser um claro sinal que o esporte pode ser um grande instrumento para a paz.