Antes que baixasse a poeira sobre o acidente de Fran Ventoso, provocado muito provavelmente por um disco de freio, a indústria marca seu posicionamento. As duas marcas mais tradicionais do mercado pisam em ovos em suas declarações, procurando não causar melindres. Já a fabricante estadunidense é mais incisiva até questionando o acindente e de ato contínuo seu esforço pela implantação dos freios a disco. Os comentários mais conscientes vieram do maestro Ernesto Colnago que aponta que além dos discos há mais alguns pontos que deveriam ser olhados em uma bicicleta de corrida quando se quer discutir a segurança
O acidente do espanhol Fran Ventoso reaqueceu o debate sobre a segurança nos pelotões profissionais. Dos problemas com circulação de motos junto aos pelotões semanas antes, à utilização dos freios a disco com o acidente do espanhol, o discurso tomou rumos apaixonados para todos os lados. E nisso tudo é importante entender que após o barulho de alguns ciclistas, a indústria dá a sua opinião oficial, e seu posicionamento sobre a questão.
O primeiro a lançar os freios a disco em bicicletas de estrada foi o maestro italiano Ernesto Colnago; nesta questão como em outras tantas coisas em sua carreira mais uma vez se posicionou à vanguarda, foi ele quem lançou ou serviu como baluarte para a implantação desse novo sistema de frenagem no mercado das estradeiras e com isso toma um posicionamento que mostra muita coerência. Coisa de quem se criou no meio a pelotões.
Ao ser questionado pelo site italiano TuttoBici, se os freios a disco são perigosos ou não, Colnago resolveu ir um pouco além nas questões de segurança em uma bicicleta: “Afirmo que prudência nunca é demais, e que é melhor encontrar alguma solução ao invés de criar inconvenientes para os ciclistas e confusão entre os fãs, mas gostaria de fazer alguns esclarecimentos….” e justo ele que lançou um produto no mercado para em tese melhorar a segurança do ciclista solta a pergunta: “Quando falamos de segurança pensamos só nos freios a disco? Todo o resto é isento de riscos?” – o maestro é sempre genial em suas conversas e à sua maneira foi provocativo com a indagação e sua resposta “Penso no peso da bicicleta de 6,8 valido para todos os ciclistas: é uma coisa boa e justa? Dando um exemplo, um ciclista que pesa 75 quilos pode usar uma bicicleta que pesa mais ou menos como aquela de um ciclista de 60 quilos? Evidentemente que não! Outro ponto é o limite de peso de 6,8 kg que se refere à bicicleta completa, mas aquilo que conta é o peso do conjunto quadro e garfo que devem ser resistentes para dar a máxima segurança ao ciclista. Não faz nenhum sentido sobrecarregar com “peso morto” uma bicicleta concebida para ser leve, isto para se atingir o limite obrigatório para competir. Se é a segurança que interessa de verdade, vamos elevar esse limite. Vamos elevar ao menos para 7 ou 7,1 quilos”.
Com um golpe de mestre Ernesto Colnago apontou para um outro problema que também é real, e que pouco ou nada se fala, afinal isso é questionar os grandes fabricantes de quadros e todo um marketing feito em cima de máquinas cada vez mais leves. Sobre os discos, apontou para o mesmo alvo de todos os fãs: “Se os discos são perigosos? Pode-se inventar uma proteção. Mas repito: o que podemos dizer sobre as rodas de fibra de carbono quando chove? Quantas quedas assistimos? Talvez elas também devessem ser modificadas, talvez substituindo a pista de frenagem em carbono por uma de alumínio” – coisa que nos primórdios das rodas de carbono já existia, e foi abandonado com o aperfeiçoamento da construção dos aros totalmente construídos em carbono.
Colnago, um mestre na arte da conversa soube tirar proveito do problema para lançar luz sobre questões que, podemos dizer, ainda estão mal resolvidas no pelotão profissional. Por outro lado alguns fabricantes de freios a disco, quando questionados pelos jornalistas da Cycling Weekly procuraram sair pela tangente; apenas a americana Sram adotou uma postura mais firme, chegando ao ponto de levantar suspeitas se a lesão do ciclista espanhol foi mesmo causada por um disco de freio: “Sram deseja a Francisco Ventoso uma rápida recuperação. Neste momento não temos evidências de que o ferimento de Francisco tenha sido causado por um disco. Estamos ansiosos por um exame mais aprofundado dos fatos” .
Por outro lado a empresa marca território e embora aceite a decisão adotada pela UCI sinaliza que manterá o seu compromisso pela proliferação e utilização dos discos como estes sendo parte do esporte em um futuro de longo prazo. “Os freios a disco são simplesmente o melhor sistema de frenagem, fornecendo mais potência, melhor modulação e um ambiente mais seguro devido ao seu desempenho superior. Continuamos comprometidos com a UCI e com a WFSGI (Federação Mundial da Indústria de Materiais Desportivos) e continuaremos a participar desse processo”.
A gigante japonesa, Shimano, patrocinadora da UCI, apontando as informações de que Ventoso teria se cortado com um disco de freio disse que não patrocina a Direct Energie que corre com bicicletas BH ( marca espanhola – Beistegui Hermanos) e nem tampouco a Lampre-Merida e que a decisão de usar os discos foi adotada pelas equipes de forma independente.
Em sua declaração diz: “A Shimano produz vários sistemas de freios para bicicletas de estrada com freios tradicionais e também freios a disco, é de escolha do ciclista o sistema de freio de sua preferencia. A Shimano não força ou obriga equipes ou ciclistas (patrocinados) a utilizarem um sistema de freio. Esta é uma escolha livre”. Usem meninos, que a coisa corre por conta e responsabilidade de cada um.
Por outro lado a italiana Campagnolo, que apresentou, mas não lançou seus freios a disco, preferiu voltar seu discurso para os testes e à atenção às normas de segurança. Além disso, disse que a opção por desenvolver esse equipamentos se deu porque UCI decidiu que os freios a disco eram adequados para as corridas de estrada, e com isso se viu obrigada a fornecer à suas equipes patrocinadas equipamentos para que pudessem competir com as outras equipes que usam freios a disco da Sram ou Shimano.
“Pretendemos fazer com que componentes e rodas representem uma vantagem tecnológica e de desempenho para nossos ciclistas, mantendo total segurança e durabilidade. A abordagem que Campagnolo assumiu, até agora, é uma prova de quão seriamente nós levamos a questão de não só o desempenho, mas também a segurança e integridade do produto “, talvez com isso tentando justificar o longo período em que passou desenvolvendo às escondidas o seu jogo de freios a disco.
E jogando dentro das regras pré-estabelecidas pela entidade que rege o esporte, apontou: “A decisão de avançar com a produção de freios a disco para corridas de estrada foi tomada há algum tempo. Campagnolo deve fornecer componentes e rodas que permitam a seus ciclistas competir com bicicletas construídas dentro das normas que a UCI considere adequadas”.
A pressão da WFSGI – World Federation of the Sporting Goods Industry (Fed. Mundial da Indústria de Artigos Esportivos) é muito grande, exigindo uma investigação mais clara sobre o acidente do ciclista da Movistar. O forte lobby feito pela entidade para que se iniciassem os testes em 2015 e sua adoção definitiva em 2017 não pode ir por terra por apenas um pedaço de pele e carne de um ciclista, a aposta é alta para que os profissionais de ciclismo possam usar os freios a disco no futuro e assim influenciar a milhares de consumidores por todo o mundo a adotar esse sistema de frenagem. Trata-se de uma renovação de frota trabalhada graças a uma nova regulamentação desportiva.
“A suspensão foi decidida pela UCI por razões de segurança, e por conseguinte, pode ser suportada. No entanto a WFSGI pede à UCI para que inicie a colaboração entre todas as partes interessadas sobre o futuro dos freios a disco e a segurança nas corridas de estrada”, declarou Robert de Kock , Secretário-Geral da entidade que cuida dos interesses da indústria e pressiona para que a entidade máxima do ciclismo encontre rapidamente uma solução.
Falta dizer que todas as empresas envolvidas poderiam colocar suas equipes de engenheiros a estudarem o desenvolvimento de proteções para os discos ou uma solução que torna-se viável a sua utilização no mundo das competições. O que poderia ser mais útil de que ficar nessa guerra de cabo entre pelotão que “agora” se encorpou contra os discos e a indústria que quer a todo custo coloca-los no mercado. Afinal aqui o problema é para quem quer competir, os discos apenas estão proibidos no mundo das competições, se você quer usá-los e tirar proveito de suas qualidades o seu uso está liberado. Mas aí pode bater aquela dúvida: e se meu ídolo não usar como é que eu fico?
O ciclista da Movistar pode até ter se machucado num disco de freio, mas poderia também ter se machucado em outra parte da bicicleta dele e de outro ciclista. Falando exatamente sobre isso, o freio a disco já é utilizado no mountain bike há muito tempo e ninguém fica fazendo tanto alarde sobre os discos de freio serem tão vilões assim. Isso é coisa do ciclismo de estrada que é muito, muito tradicionalista.
Mas, quem se arrisca a descer uma montanha de mais de 20km há mais de 90km/h e com chuva, com certeza se arriscaria muito mais em utilizar um freio convencional do que um a disco hidráulico. Os freios á disco hidráulicos são extremamente precisos e freiam tão bem no seco ou no molhado. Eu mesmo, descendo o Col de La Madeleine com chuva já tive o pneu dianteiro furado de tanto que o aro aqueceu a câmara de ar devido à necessidade de se frear. A cãmara simplesmente estourou de uma hora para a outra. Sorte que eu estava em uma reta há mais de 80km/h e consegui parar a bicicleta antes da curva. Se eu estivesse utilizando freios a disco hidráulicos, isso não teria acontecido.
Outra questão é quanto a utilização de aros em fibra de carbono e freio sconvencionais. Isso é a pior combinação em termos de segurança. Não existe precisão na frenagem e muito risco das rodas travarem quando vc não quer.
Sendo assim, pelos dois motivos alertados acima, acho muito mais perigoso continuar a utilização de freio convencionais do que à disco, pois as quedas que poderiam ser evitadas nas descidas são muito mais perigosas do que a possibilidade de se machucar em um tombo em grupo.
Abs,
Cleber Ricci Anderson
E como fica o motocross, não achei um relato se quer sobre acidente com discos de freio no motocross, as motos não usam proteção nos disco, apesar de existir proteções para esses sistemas.
Sobre motocross não posso afirmar nada. Mas já vi em algumas provas, principalmente de enduro mx motos com essa proteção